quinta-feira, outubro 01, 2009

UM POETA E UM POEMA (3)

A poeta da vez é Christina Ramalho. Carioca, nascida em 1964, a Chris é mestre e doutora em Semiologia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Além de artista plástica (dona de belíssimas pinturas!), é também escritora de mão cheia: ensaísta, cronista, contista, poeta, crítica literária, tendo vários livros publicados.

Foi minha professora de Literatura no curso de Letras. É, para mim, um exemplo de profissional e, acima de tudo, de ser humano. (Imagem tirada daqui).

Sina
(Christina Ramalho)

Mundo, mundo, vasto mundo,
e eu que me chamo Raimunda,
feia de cara, boa de bunda,
terei uma solução?
Será que esta minha sina
de guardar a forma feminina
deixa mostrar em meu verso
quão vasto é o meu coração?

Na face trago as lágrimas
de cebolas e de paixões
e minhas pernas, fumês e amarelas,
passam no bonde das estações.
Amo inventando penas,
me ensinaram a amar assim...
Mundo, mundo, vasto mundo,
o que será que será de mim?

Peço a Deus que me conceda
nada pedir tudo ver.
Duro viver nesta terra estranha
onde ter entranhas faz padecer.
Vasto, vasto, mundo vasto,
te pergunto e me desgasto:
se o versejar é meu pasto,
terei eu o que comer?

Espero resposta deitada
de flanco sobre o lençol,
nos sonhos eu viro onda
e o sonho é meu farol.
E se disseres - levanta! -
levanto e vou para a faxina.
E se disseres - derrama! -
derramo em versos minha sina.

Mundo, mundo, amargo mundo...!
Mas doce é minha intenção
de velar tua amargura
com rimas de compreensão.
Mundo, mundo, amargo mundo,
não veja nisto submissão.
O que eu quero é uma voz
gritando suave como canção.


(In A Lírica Brasileira do Século XX, p. 136, de Anazildo Vasconcelos da Silva).

Saiba mais sobre a autora aqui e aqui

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